Benfica-Amadora, 2-1: Foi preciso um milagre das túlipas para expiar pecados de Heynckes
VAN HOOIJDONK SUBIU AO ALTAR DA CATEDRAL DA LUZ E JÁ É SANTO PADROEIRO DO BENFICA
Comecemos pelo fim. Quando Djalma, aos 79 minutos, enfiou a bola no fundo da baliza à guarda de Robert Enke, o Estádio da Luz, com uma moldura de 30 mil espectadores, veio abaixo num megacoro de protestos. A “cabeça” de Jupp Heynckes era exigida por milhares de “pañuelos” e parecia inverosímil que o Benfica pudesse dar a volta ao jogo. Porém, uma palavra não existe no dicionário do futebol: “impossível”. E o holandês Van Hooijdonk, elevado segunda-feira ao altar da catedral da Luz, encarregou-se de realizar o milagre das túlipas, marcando dois golos que valeram três pontos nos derradeiros momentos do encontro.
Foi um final emocionante, que arrebatou os adeptos do Benfica e os fez esquecer as muitas razões de queixa que tiveram ao longo de quase todo o jogo. Na Segunda Circular, as buzinas dos automóveis cortaram o silêncio da noite fazendo uma festa quiçá desproporcionada para a importância de uma vitória caseira sobre uma equipa que só pretende fazer um campeonato tranquilo. Mas o tempo é de “vacas magras” e os golos de Van Hooijdonk aplacaram a ira do povo e ofereceram a Jupp Heynckes mais um balão de oxigénio.
O Estrela da Amadora, que teve o pássaro na mão, ainda deve estar para perceber como foi possível “entregar o ouro ao bandido”. A inspiração de Van Hooijdonk explica quase tudo. O facto de, depois de uma demora “penosa e lamentável”, Heynckes lá ter colocado João Tomás em campo também ajudou à libertação do holandês, com as consequências benéficas para o Benfica que se conhecem.
BARAFUNDA
O facto de os encarnados terem vencido a partida – nas condições dramáticas já descritas – não pode branquear uma realidade que esteve patente perante os olhos de quem esteve ontem na Luz. A equipa surgiu no terreno com uma táctica surrealista e isso custou-lhe, pelo menos, 45 minutos de eficácia. Jupp Heynckes – e será que o técnico alemão tem consciência de quanto grato deve estar a Van Hooijdonk? – resolveu inventar, deixou Dudic no banco (é titular da selecção da Jugoslávia, foi visto pelos olheiros do clube durante meses a fio e, mesmo assim, não tem direito a uma oportunidade séria) e arranjou uma fórmula sem pés nem cabeça que teve o condão de apagar do jogo, ao longo do primeiro tempo, Maniche e Poborsky. O Benfica apareceu em 3x3x3x1, com os dois jogadores já referidos a terem de tapar defensivamente o flanco direito. Não foram carne nem peixe, defenderam assim-assim e atacaram sempre desapoiados. Uma lástima da qual acabaram por ser as principais vítimas.
Perante um Estrela da Amadora ainda sem a elasticidade da época passada, que fez um jogo apenas certinho, feliz pelos trunfos que o banco contrário estava a dar-lhe, o Benfica raramente ligou o jogo e desperdiçou Van Hooijdonk, encravando-o entre Raul Oliveira e Fonseca. A equipa da Luz afundava-se numa enorme barafunda táctica e os jogadores eram os primeiros a dar sinais de que não percebiam bem o que o treinador queria deles. Paulo Madeira, por exemplo, dividido entre o policiamento ao ponta-de-lança e o flanco direito, esteve manifestamente intranquilo e Fernando Meira, entre o transporte de jogo e a ajuda aos centrais, também foi vítima de um sistema sem eira nem beira.
TREMIDEIRA
Para a segunda parte, Heynckes colocou Paulo Madeira na direita, recuou Meira para central e lançou a equipa num 4x4x1x1 mais equilibrado. Sofrendo, contudo, do pecado da previsibilidade. Cruzamentos – normalmente mal tirados – à procura da cabeça de Van Hooijdonk, algumas tentativas de Uribe ou Maniche de meia distância e um ou outro desequilíbrio de Ronaldo ou Meira eram presas fáceis para a organização do Estrela. Metia-se pelos olhos dentro que o Benfica tinha pouca presença na área e a entrada de João Tomás era absolutamente necessária para desequilibrar a estrutura montada por Quinito. O técnico da Amadora, depois de, sagaz, ter experimentado deslocar Semedo para a direita, continuou a apostar na velocidade do contra-ataque (Luís Carlos por Djalma), enquanto o treinador do Benfica se limitou a uma inócua troca de Kandaurov por Miguel. E foi então que o Estrela, educadamente, primeiro avisou, por Lázaro, aos 72 minutos, com Fernando Meira a salvar sobre a linha de golo, e depois marcou mesmo, com um tiraço de Djalma.
O SUAVE MILAGRE
A perder e inundado de lenços brancos, Jupp Heynckes lá se resolveu a meter em jogo João Tomás, que bem útil foi tacticamente. O Benfica, finalmente, teve condições para apoiar Van Hooijdonk e o holandês explicou a quem não o conhecia o porquê das suas 17 internacionalizações (sete golos) pela “Laranja Mecânica”, com dois golos de grande classe, o primeiro a encher o pé, batendo Tiago, e o segundo a aproveitar o corpo que Deus lhe deu para, mesmo marcado, rodar e rematar cruzado para delírio da plateia encarnada. O Benfica subia ao Céu depois de ter andado perdido nas profundezas do Inferno. Mas milagres não podem ser encomendados todas as santas noites...
Olegário Benquerença complicou, por vezes, um trabalho que não pareceu excessivamente difícil. Num lance de bola na mão de Kenedy, aos 58 minutos, pareceu ter ajuizado bem. Da mesma forma que a rotação de Van Hooijdonk, no lance do segundo golo, também decorreu dentro das leis.
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