O MARÍTIMO venceu domingo o Benfica por claros 3-0, mantendo o seu registo 100 por cento vitorioso nos Barreiros e obrigando os encarnados a continuar à procura da sua primeira vitória fora.
O jogo foi atípico, com o Benfica a controlar a bola por mais tempo, a conseguir clara superioridade territorial, mas a falhar no que é cada vez mais importante: o equilíbrio e a concretização.
Apesar de ter ganho treze cantos contra zero e de ter efectuado 23 remates contra nove, a equipa da Luz jogou com a defesa muito adiantada e permitiu que Lagorio se isolasse por três vezes face a Enke. O argentino não perdoou uma única, tornando-se o primeiro jogador a marcar três golos no mesmo jogo ao Benfica desde que Manuel Fernandes o fez (marcou quatro) pelo Sporting, nos famosos 7-1 de Dezembro de 1986.
É claro que o risco e o futebol ofensivo são bens necessários ao jogo. Mas o equilíbrio é mais importante ainda. É verdade que se todas as equipas jogassem como o Marítimo o fez, com dez jogadores sempre atrás da linha da bola de forma a explorar o espaço nas costas da defesa contrária em contra-ataques rápidos e eficazes, a modalidade não teria muito espectáculo e perderia adeptos.
O modo de jogar que o Marítimo apresentou precisa de um adversário descompensado. Mas domingo teve-o e aproveitou-o. Fez bem, foi mais inteligente e mais competente. Embora tenha visto o Benfica acertar duas vezes nos postes da baliza defendida por Nélson antes do primeiro golo de Lagorio, o Marítimo ganhou com inteira justiça.
Além disso, também acertou no poste uma vez e viu José Pratas negar-lhe uma grande penalidade evidente, nos instantes finais e já com o resultado em 3-0, no que apenas pode ter sido um acto de compaixão.
DUAS BOLAS AO POSTE
José Mourinho apresentou domingo uma novidade táctica, com três defesas-centrais, dois flanqueadores, um triângulo a meio-campo e dois pontas-de-lança. Contudo, o sistema inclinava-se para um lado, já que Poborsky não recuava tanto à direita como Diogo Luís fazia na esquerda, obrigando Paulo Madeira a uma vigilância mais atenta de um lado do que Marchena do outro.
O sistema mostrou virtudes, como uma maior capacidade de ganhar bolas na área do adversário, mais a mais porque Vingada arriscou ali o dois contra dois, com Carlos Jorge e Paulo Sérgio perante João Tomás e Van Hooijdonk.
Mas também mostrou carências, sobretudo no que diz respeito à coordenação defensiva. E é estranho que, depois de já ter arriscado a mudança de sistema, dando-lhe um cariz bastante mais ofensivo, contra o Boavista, no Bessa, Mourinho tenha feito esta alteração em mais uma deslocação difícil.
É bom que se saiba, contudo, que a virtude da alteração podia ter garantido a vitória ao Benfica muito antes de se fazerem notar as suas enormes carências. João Tomás rematou ao poste num dos muitos cantos bem apontados por Dani, aos 5 minutos, e Maniche atingiu o outro poste, após boa iniciativa de Poborsky pela direita, aos 12’.
Um minuto depois, um passe genial de Mariano isolou o argentino Lagorio, que foi mais rápido que Marchena e Meira e fez o 1-0 “na cara” de Enke, como que a demonstrar que a ineficácia concretizadora do Benfica foi um mal a ter em conta. E muito, pois em 23 tentativas, das quais pelo menos 10 em excelente posição, dentro da área, os encarnados não marcaram nem obrigaram o guarda-redes a intervenções de dificuldade.
Com o Marítimo a ganhar, acentuou-se o tom cauteloso do 4x4x2 de Nelo Vingada, onde Lagorio era muitas vezes o único jogador a ficar à frente da linha da bola.
Até o segundo avançado, Porfírio, recuava para ajudar um meio-campo onde Bruno e Mariano, eram gigantes tanto a defender como a atacar. Só assim é que, apesar de apresentar dois jogadores com rotina de médios-ala a defesas-laterais, o Marítimo foi segurando o Benfica, que surpreendia pela qualidade das suas combinações ofensivas e pela incapacidade de calibrar os remates que se lhes seguiam.
Ao mesmo tempo, a defender, faltavam as compensações, o que motivou que tivesse sido do Marítimo a melhor oportunidade de golo verificada até ao intervalo, quando Bruno abriu a Mariano as portas da glória e este acertou no poste.
FALHAS E CONTRAS
Com a segunda parte, o Benfica adiantou as suas linhas alguns metros, criando as condições ideais para que os madeirenses se beneficiassem dos 50 metros existentes entre os centrais e Enke.
O Benfica pegou no jogo, é verdade, mas ainda nem tinha criado perigo quando Lagorio aproveitou um alívio defensivo de Albertino para se isolar entre Calado e Meira e, mais uma vez “na cara” de Enke, fazer o seu segundo golo.
Iam decorridos 53 minutos, José Mourinho chamou Sabry para o lugar de Diogo Luís, aumentou o cariz ofensivo da sua equipa e... sofreu o terceiro golo. Desta vez foi Iliev quem isolou Lagorio que, outra vez perante Enke, mostrou que não é jogador para falhar nestes lances.
O Marítimo tinha o jogo resolvido, em parte graças à eficácia do recital de contra-ataque que interpretou nos Barreiros, em parte devido à falta de concentração do Benfica, que desapareceu do relvado após o 2-0: a primeira falta dos encarnados na segunda parte surgiu aos 70 minutos.
O que até era bom se isso mostrasse que o jogo estava a ser limpo, mas não foi, porque o que daí se retira é que os jogadores não se empenhavam na luta nem iam ao choque quando era o adversário a conduzir a bola.
O jogo foi-se assim arrastando até ao fim, com “olés” da bancada sempre que os verde-rubros ensaiavam mais um contra-ataque e suspiros de exasperação dos benfiquistas quando os lisboetas se acercavam da área de Nélson, dada a incapacidade revelada para meter a bola nas redes, apesar da insistência de Maniche e João Tomás, de todos os que mais tentaram.
O Benfica sofria assim a sua derrota mais expressiva da época (já não perdia por 3-0 desde que isso lhe aconteceu na Amadora, no derradeiro campeonato) e baixava para o nono lugar da tabela, a 10 pontos do líder.
O Marítimo, por sua vez, conseguia o “score” mais expressivo da época (o 4-0 podia ter surgido se José Pratas tivesse visto um “penalty” cometido por Calado sobre Lagorio, aos 85’), confirmava a sua irredutibilidade neste estádio, onde ganhou todos os jogos, e subia para o oitavo lugar, ultrapassando o seu adversário. Ajudando a provar que, mais que Jardel ou Roger, o que domingo faltou ao Benfica foi tacto. E disso há pouco à venda no mercado.
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